Como saber se tenho transtorno alimentar?

Postado em 06/05/2024 às 17h:47

Ao falarmos de transtornos alimentares, precisamos entender primeiro o que se caracteriza como um transtorno alimentar e o que não se caracteriza. A alimentação tem diversas funções no nosso cotidiano, como a função nutricional/fisiológica (que consiste em fornecer ao corpo os nutrientes e a energia que ele necessita), a função social (que consiste basicamente em fortalecer ou criar vínculos com as pessoas, socializar, estabelecer contato), a função psicológica/emocional (que consiste na alimentação exercendo um papel mais de regulador emocional, um exemplo seria a preferência por alimentos hiper palatáveis em um contexto de tristeza, ou em um momento de comemoração).

Paralelamente a isso, uma “alimentação ideal” – entre muitas aspas – seria aquela onde o indivíduo consegue manter um ótimo equilíbrio entre essas três funções (nutricional, social e emocional), ou seja, ele consegue se alimentar em todos esses contextos, manter uma composição corporal saudável e, além de tudo, não ter prejuízos por conta de sua alimentação. Todavia, essa alimentação “ideal” é, justamente, algo muito idealizado, e pouco comum no cotidiano das pessoas.

É essencial sabermos que podemos ter uma alimentação que, por mais que não seja a “ideal”, é uma alimentação funcional, ou seja, que não acarreta mais malefícios que benefícios, no entanto, isso dependerá de diversas escolhas de vida, um exemplo seria alguém que tem maior preferência/prioriza os momentos sociais, deixando assim a parte nutricional de lado.

Ademais, vale ressaltarmos que nem todo o indivíduo que está com uma alimentação “disfuncional” está, necessariamente, com um transtorno alimentar. Uma alimentação disfuncional é aquela que se inicia com uma discrepância entre essas funções, ou seja, há uma incompatibilidade entre as formas de comer.
Essa alimentação pode evoluir para uma alimentação “transtornada”, que ocorre quando um desses aspectos recebe uma prioridade tão grande que o prejuízo nos outros aspectos (nutricional, social e emocional) acaba se tornando algo prejudicial, fornecendo um caráter negativo na experiência daquele indivíduo com o comer.

Um indivíduo com anorexia, por exemplo, irá priorizar a função nutricional da alimentação (mais especificamente as calorias de cada alimento), devido a sua vontade (tal qual uma “necessidade”) imensa de perder peso. Por outro lado, é visto que as outras funções de alimentação, desse indivíduo, acabam por ficar bastante prejudicadas (deixadas de lado). Isso ocorre pois, normalmente, essas pessoas acabam por deixar de ter o convívio social, de forma a manter-se em seu “objetivo nutricional” (manter-se na dieta que acreditam ser excelente para si).

Provavelmente agora você deve estar se perguntando, enfim, quando essa alimentação disfuncional se torna uma alimentação transtornada? A realidade é que não há uma definição exata para isso, tendo em vista que não há “um ponto de corte” entre esses dois aspectos, além disso, atualmente, temos uma normalização de grande parte dos comportamentos que antes eram considerados disfuncionais e transtornados.
O que devemos levar em conta e prestar bastante atenção, antes de julgar uma atitude como “disfuncional ou não”, é a cultura onde esse indivíduo se encontra. Cortar o arroz da dieta pode ser uma atitude disfuncional para quem vive em locais com elevado consumo de arroz, mas pode não ser para aqueles que não estão imersos em uma cultura em que há muito consumo desse alimento específico.

Outro aspecto que devemos levar em conta é o público que estamos lidando, por exemplo, uma pessoa que ao iniciar uma rotina de treinos acaba se ausentando 100% de eventos sociais com seus amigos, além de cortar 100% o consumo de alimentos mais palatáveis e álcool. Isso pode sim ser indicativo de uma alimentação disfuncional, mas devemos ter em mente que, antes de julgar como disfuncional ou não, é necessário avaliar melhor quem é esse indivíduo. Se fosse um atleta olímpico realizando esse comportamento, por exemplo, já seria um contexto diferente, já que se trata de um comportamento esperado para esse perfil.

Outro ponto que devemos levar em consideração é a época. A psicometria é uma área da psicologia responsável por tornar mensurável comportamentos subjetivos, como com a aplicação de um questionário, em um indivíduo, para gerar um escore (que quantifica, por exemplo, a tendência que um indivíduo tem de desenvolver transtornos alimentares). Alguns questionários mais antigos perguntavam se o indivíduo consome alimentos dietéticos, pois isso contava negativamente na tendência desse indivíduo em ter uma alimentação disfuncional, já que naquela época não era comum pessoas sem comorbidades (saudáveis) consumirem esse tipo de alimento – ou seja, naquela época em que o questionário foi feito, essa pergunta fazia sentido.

Além de tudo isso, devemos ter em mente que a área de estudo acerca dos transtornos alimentares é relativamente nova na ciência. Atualmente, há o DSM (Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais), que é um material que comporta as características de cada transtorno psiquiátrico.
Um grande problema é o fato de que muitos estudos são realizados no exterior, onde é bem diferente o papel do nutricionista (quando comparado ao Brasil), e isso dificulta o estabelecimento de alguns conceitos e atribuições. Consequentemente, o tratamento dos transtornos alimentares também encontra dificuldades no embasamento científico, já que nem sempre há evidências muito embasadas.

Dentre os principais transtornos alimentares existentes, há a anorexia nervosa, que é caracterizada por uma restrição calórica autoimposta muito grande e, consequentemente, provocando uma perda de peso significativa. A bulimia nervosa, por outro lado, é caracterizada pela ocorrência de episódios de exageros alimentares acompanhados de comportamentos purgativos (como a indução de vômito, o uso excessivo e desnecessário de laxantes, a prática extenuante e exagerada de exercícios físicos etc.), de forma a tentar evitar o ganho de peso.

Há também o transtorno de compulsão alimentar, que é caracterizado por episódios de exageros alimentares sem o uso de comportamentos purgativos e/ou compensatórios. Vale ressaltar que é necessário ter um número mínimo de episódios de compulsão por semana e uma duração mínima desse comportamento compulsivo para que esse indivíduo seja diagnosticado com o transtorno de compulsão alimentar.

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Por fim, há também o transtorno alimentar não especificado, que é o caso de um indivíduo que tem características de uma alimentação transtornada, porém ainda não se enquadra nos critérios diagnósticos de nenhum outro transtorno. Esse último é um dos transtornos alimentares com maior prevalência atualmente.

É importante entendermos que a classificação dos transtornos alimentares, hoje, não é muito bem definida, o que mostra como devemos olhar com cuidado também para aqueles pacientes que ainda não se enquadram em um TA específico. Além disso, há apresentações distintas de um mesmo transtorno, isso é variável conforme o indivíduo. Há um espectro de controle dentro da alimentação do indivíduo, você pode estar no equilíbrio entre uma “ausência de controle” e um “comer excessivo”, mas algum indivíduo pode estar nesses extremos, o que é negativo.

Quanto aos dados epidemiológicos dos transtornos alimentares mais populares mundialmente, é visto que, na população em geral, há uma prevalência de 0,5 a 1% de anorexia nervosa (maioria mulheres), a bulimia nervosa é de 0,5 a 4% (maioria mulheres), e a transtorno de compulsão alimentar é de 1 a 3,5% (principal transtorno em homens).

Texto por: Pietra Fogaça – Nutricionista
Revisão: Talita Szidlovski

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