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Por Pietra Fogaça

Graduanda em nutrição pela UFRGS, antropometrista ISAK nível 1 e atleta de fisiculturismo.

Entenda o que é o transtorno de compulsão alimentar

Postado em 02/10/2024 às 12h:00

Primeiramente, é necessário entendermos que o Transtorno de Compulsão Alimentar (TCA) é caracterizado por episódios recorrentes de ingestão descontrolada de grandes quantidades de alimentos, acompanhados de uma sensação de perda de controle sobre o ato de comer. Diferentemente de outros transtornos alimentares, como a bulimia nervosa (BN), o TCA não envolve comportamentos compensatórios.

Segundo os critérios diagnósticos do “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (DSM- IV), para que seja caracterizado o TCA, esses episódios compulsivos devem ocorrer, em média, pelo menos uma vez por semana durante um período de três meses. Além disso, o indivíduo apresenta uma série de sentimentos negativos após o episódio, como culpa, vergonha ou angústia.

Entre as características específicas do transtorno, incluem-se: comer mais rapidamente do que o normal; comer até sentir-se desconfortavelmente cheio; comer grandes quantidades de alimentos mesmo sem sentir fome física; comer sozinho devido à vergonha da quantidade consumida; sentir-se enojado consigo mesmo, deprimido ou muito culpado após os episódios.

O TCA – antes chamado de “transtorno de compulsão alimentar periódica” – foi descrito na ciência pela primeira vez em 1959 e, durante muitos anos, esse transtorno alimentar esteve fortemente associado à obesidade, perpetuando a ideia de que ambos estariam necessariamente ligados. Contudo, pesquisas recentes apontam que cerca de 25 a 30% das pessoas obesas apresentam TCA, o que demonstra que, embora exista uma interseção entre as duas condições, não se pode afirmar que a obesidade é uma consequência direta do transtorno alimentar.

Foi apenas em 1994 que o TCA passou a ser reconhecido no DSM-IV como uma categoria que demandava mais estudos. A investigação desse distúrbio baseou-se em sua semelhança com os episódios de compulsão que ocorrem na BN, porém, conforme mencionado anteriormente, diferentemente deste, o TCA não envolve comportamentos compensatórios, como a prática de exercício físico em excesso, indução de vômito ou uso de laxantes após os episódios… Somente em 2014, com a chegada do DSM-V, o TCA foi oficialmente classificado como um transtorno alimentar.

Ainda não há um consenso absoluto sobre o significado exato de “compulsividade”, o que gera confusão no campo da saúde e torna difícil a comparação entre diferentes transtornos. No entanto, de maneira geral, a compulsão pode ser entendida como um comportamento irracional, em que a pessoa busca um alívio rápido e temporário para algum tipo de desconforto emocional, seguido de um arrependimento ou mal-estar maior do que o inicial. A pessoa consome uma quantidade muito grande de comidas e/ou bebidas e, logo depois, é completamente “tomada” por uma sensação de tristeza e fracasso, na grande maioria das vezes! No caso da compulsão alimentar, o indivíduo sente uma necessidade urgente e incontrolável de comer, muitas vezes sem sentir fome. O ato de comer excessivamente e de forma desordenada, repetidamente, configura o quadro de TCA.

É importante destacar que o termo “compulsão alimentar” costuma ser confundido com “descontrole alimentar”. Tenho certeza de que você já ouviu alguém falar que teve uma “compulsão” pois comeu um chocolate a mais após o jantar.
Apesar de a “compulsão alimentar” ter sim pontos em comum com o “descontrole alimentar”, eles não são termos sinônimos. O comportamento compulsivo é caracterizado por uma sensação de obrigação de realizar o ato repetidamente, mesmo sabendo que ele é prejudicial ou não necessário. Já o descontrole alimentar pode acontecer de forma esporádica e não está, necessariamente, relacionado ao TCA, especialmente quando não há o sentimento de culpa associado, como ocorre no comer impulsivo.

Agora vamos entender especificamente quanto às características de um episódio de compulsão alimentar, que é algo bem confundido entre muitos indivíduos. Durante uma crise de compulsão alimentar, a pessoa ingere uma quantidade de comida muito maior do que normalmente comeria em um curto espaço de tempo (ela come muito rápido e praticamente nem percebe esse momento). Além disso, os alimentos consumidos são, em geral, de fácil acesso e preparo, com uma preferência por alimentos ricos em carboidratos e gorduras. É comum que o paciente com TCA opte por alimentos prontos ou mal preparados, como arroz frio, macarrão instantâneo cru ou até mesmo carne crua. Eventualmente, o indivíduo pode até consumir alimentos que não são seguros para consumo, como comidas do lixo e alimentos estragados/mofados.

Embora cada pessoa com TCA seja única, é possível identificar certos padrões comuns. De forma geral, esses episódios compulsivos estão relacionados à baixa autoestima e a sentimentos como culpa, tristeza e vergonha, que frequentemente surgem após o ato de comer compulsivamente. Esses sentimentos negativos podem, por sua vez, desencadear ansiedade e desconforto emocional, o que alimenta um ciclo vicioso de “tudo ou nada”, levando a novos episódios de compulsão alimentar.

Ainda que uma grande parcela das pessoas com obesidade apresenta TCA, nem todos os indivíduos obesos sofrem de compulsão alimentar. A distinção entre obesos com e sem o transtorno pode ser observada através de certos padrões comportamentais. Pacientes obesos com TCA tendem a demonstrar maior preocupação com questões estéticas, o que acaba gerando um ciclo de frustração e uma busca desenfreada por alimentos saborosos como forma de escape. Esse comportamento é típico de indivíduos que têm dificuldade em controlar sua alimentação de maneira consciente.

Os episódios de compulsão alimentar geralmente ocorrem como uma resposta emocional negativa a sentimentos de tristeza, ansiedade, frustração ou até mesmo tédio. Nesses casos, o ato de comer não é motivado pela fome, mas sim pela necessidade de lidar com essas emoções. O alimento acaba funcionando como uma válvula de escape, mas a sensação de alívio é seguida por culpa e vergonha, perpetuando o ciclo de compulsão.

O tratamento do TCA costuma ser multidisciplinar, envolvendo psicoterapia, como a terapia cognitivo-comportamental (TCC), que se mostrou eficaz na redução dos episódios compulsivos, além de intervenções nutricionais e, em alguns casos, farmacoterapia (normalmente através do uso de antidepressivos). O objetivo é ajudar o paciente a desenvolver uma relação mais saudável com a comida e a gerenciar melhor suas emoções, prevenindo a recorrência dos episódios de compulsão alimentar.

Texto por: Pietra Fogaça – Graduanda em nutrição

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