Análise de gases sanguíneos capilares em atletas paralímpicos
Postado em 21/07/2025 às 17h:15
A análise fisiológica em atletas de alto rendimento tem se tornado cada vez mais sofisticada, especialmente com o avanço de tecnologias portáteis que permitem medições rápidas, precisas e minimamente invasivas. Entre essas inovações, destacam-se os dispositivos de ponto de atendimento (Point-of-Care, POC), capazes de realizar exames laboratoriais diretamente no ambiente de treino ou atendimento clínico. Um recente estudo, publicado no periódico Sports em 2025, investigou a confiabilidade das análises de gases sanguíneos capilares em repouso em velocistas paralímpicos de elite. O objetivo foi verificar se variáveis relacionadas ao estado ácido-base, como pH, pCO₂, HCO₃⁻, excesso de base (BE), além de biomarcadores como hemoglobina, creatinina e ureia, poderiam ser medidas de forma confiável usando amostras de sangue capilar e um analisador portátil, em condições repetidas no mesmo dia e em diferentes dias.
Sete atletas da Seleção Brasileira Paralímpica participaram da pesquisa, incluindo homens e mulheres com deficiências visuais e físicas, todos com histórico de mais de dez anos de treinamento e participação nos Jogos Paralímpicos de Paris 2024.
As coletas foram realizadas em duas etapas: três amostras consecutivas no mesmo dia para testar a confiabilidade intra dia, e duas coletas com intervalo de cinco dias para verificar a consistência interna. As análises foram feitas com o dispositivo Epoc System®, amplamente validado no contexto clínico, é considerado prático para uso em campo.
Os resultados mostraram que não houve diferenças estatísticas significativas entre as amostras coletadas em nenhuma das condições avaliadas.
Variáveis como pH, HCO₃⁻, creatinina e ureia apresentaram excelentes índices de reprodutibilidade, com coeficientes de correlação intraclasse (ICC) superiores a 0.90. A hemoglobina e o pCO₂ também demonstraram alta consistência.
A única exceção foi o excesso de base, que apresentou maior variabilidade individual e um ICC mais baixo, sugerindo que seu uso deve ser interpretado com cautela em contextos esportivos.
A análise de correlação e os testes de Bland–Altman reforçaram esses achados, demonstrando baixos erros típicos e limites estreitos de concordância, especialmente para pH, HCO₃⁻ e creatinina.
Além dos dados estatísticos, o estudo traz reflexões fisiológicas importantes. Os atletas apresentaram valores de pH levemente elevados e pCO₂ reduzido em repouso, um achado que pode indicar tendência à alcalinização sanguínea, possivelmente explicada por adaptações respiratórias e ventilatórias associadas ao treinamento de alto nível.
A manutenção dos níveis de bicarbonato e hemoglobina mesmo após o período de descanso pós-competição reforça essas adaptações, típicas de atletas bem condicionados. A creatinina e a ureia também se mostraram estáveis durante o intervalo entre as coletas, mesmo com pequenas alterações na carga de treino, o que reforça seu valor como marcadores de integridade renal e metabolismo proteico no monitoramento de carga e recuperação.
Com base nesses resultados, o estudo conclui que a análise de gases sanguíneos capilares via POC é confiável e aplicável ao acompanhamento de atletas paralímpicos. A simplicidade do método, aliada à sua precisão e à possibilidade de uso em ambientes esportivos, torna essa ferramenta uma opção promissora para profissionais de fisiologia, treinamento esportivo e reabilitação. Embora o excesso de base requer mais investigação, as demais variáveis se mostram consistentes para uso em estratégias de monitoramento, tanto em fases de base quanto em períodos competitivos.
Trata-se do primeiro estudo a avaliar a reprodutibilidade dessas medições em atletas paralímpicos de elite, oferecendo uma importante contribuição para a ciência aplicada ao esporte. A análise de gases sanguíneos capilares, anteriormente restrita ao ambiente hospitalar, agora se apresenta como um recurso acessível e eficiente também para o alto rendimento esportivo, reforçando a importância do uso de dados objetivos na tomada de decisões sobre carga, recuperação e prevenção de lesões.
Conteúdo extraído da publicação original:
Reliability of Capillary Blood Gas Measurements in Paralympic Sprinters at Rest: A Pilot Study.
Autores:
Thiago Fernando Lourenço, Samuel Bento da Silva, Vinícius Miguel Zanetti, Ana Gabriela Almeida Maximo Pereira, João Vitor Ichikawa Quintella, Oriane Martins, Amaury Veríssimo e Lazaro Alessandro Soares Nunes – professor da Faculdade UNIGUAÇU.