Como identificar os sinais de fome e saciedade?
Postado em 26/08/2023 às 08h:55
Primeiro de tudo, é importante entendermos que fome e apetite são coisas diferentes.
As sensações viscerais (principalmente as localizadas no estômago) tem sim o seu valor, mas não podemos dissociar o estado de fome (por exemplo, estar com o “estômago roncando”) com o aspecto afetivo da alimentação. Ou seja, sempre que estamos com fome, há sim junto a isso um aspecto de desejo envolvido, e também uma busca por aquilo que confere mais prazer (a comida mais gostosa).
E é por isso que a frase “quem tem fome come qualquer coisa” é um grande equívoco na maioria das vezes… Afinal, se for possível escolher o que será consumido, o indivíduo provavelmente escolherá aquele alimento de maior palatabilidade (o que é mais gostoso e mais calórico).
Os aspectos de reforço do comportamento são baseados na intensidade do reforçador (exemplo: pizza) em conjunto com o estado do indivíduo (como ele está naquele momento).
Por exemplo: se eu estou com fome e tenho na minha frente 500 calorias de batata doce com frango e também 500 calorias de pizza e, ao mesmo tempo, já estou há muito tempo sem comer/com desconforto grande, irei preferir o mais prazeroso (a pizza).
Se você come as suas emoções, leia esse texto!
Além disso, com relação ao aspecto afetivo do comer, esse pode ser composto por gostar (reação hedônica ao estímulo) ou querer (desejo ao estímulo), ou seja, são conceitos diferentes.
Os pensamentos relacionados à fome, a dor de cabeça, a tontura, a irritabilidade, a falta de concentração e o estresse também são aspectos observados quando o indivíduo está há um tempo sem comer.
Essas percepções de fome podem ser influenciadas pelo nível de estresse e pelo tempo que ficou sem comer. Então, por mais que não tenha ocorrido – de fato – uma queda de energia significativa nesse indivíduo por ter ficado algumas horas sem comer, ainda assim ele sente esse desconforto de qualquer forma, pois ele “rompeu com as normas internas dele”. Ou seja, isso é o cérebro se antecipando para que não ocorra a sensação de escassez e, quando ele vai comer ele acaba comendo provavelmente em maior quantidade (não por déficit de energia, mas sim por rompimento de normas).
Por isso que usar somente os sinais do estômago para diferenciar “fome fisiológica” de “fome emocional” não é tão confiável… Às vezes, uma percepção de estresse maior e um tempo de intervalo sem comer influenciam muito.
Pessoas que foram gastrectomizadas (tiraram o estômago) não tem aquele sinal de motilidade gastrintestinal (“estômago roncando”) e, mesmo assim, apresentam desejos. Elas presentam estados normais de fome e saciedade na ausência do estômago, o que demonstra contribuição significativa dos componentes cognitivos da fome (motivacional/afetiva), sinais de fome ALÉM do estômago.
Ademais, os aspectos sensoriais também influenciam muito! Quanto mais opções de comidas há no ambiente, mais o indivíduo quer obter de todas aquelas opções. Ou seja, há uma redução na percepção de saciedade quando há estímulos distintos presentes no ambiente que também caracterizam uma recompensa. Nós queremos quase sempre “saciar a diversidade em vez da quantidade”.
Pensando na resolução ou melhoria dessas questões, devemos compreender que o comportamento de abordagem nem sempre depende do estado de fome, mas sim do ambiente e da maneira que esse indivíduo se condicionou ao ambiente.
Aumentar a tolerabilidade do indivíduo ao desconforto é o ponto chave para conseguir manter o processo sem que haja as expectativas de prazer que ele tinha antes com os alimentos que ele consumia.
Para melhorar, tente estabelecer intervalos habituais entre as refeições, pois há uma melhor organização de rotina, já que o estresse percebido entre os intervalos de fome (relacionado a ausência de consumo de alimentos no horário programado) caracteriza possivelmente um comportamento mais exagerado na hora que for comer. Pode ser interessante ter alimentos/lanches “na manga” para situações de emergência, de forma a minimizar a percepção de fome.
É importante também trabalhar com a higiene ambiental, cuidar os estímulos do ambiente (visão, olfato, paladar, pensamentos em comida). Analisar também o estado de avaliação subjetiva (estado interno), que é o quanto ele PERCEBE de fome e não o que ocorre realmente (fatores estressantes influenciam nisso aumentando a percepção de desconforto).
É importante então trabalhar com o paciente o ato de fazer uma leitura melhor da situação para minimizar essa percepção de estresse e ensiná-lo a desenvolver maior RESILIÊNCIA ao estresse, aprender a LIDAR com o desconforto e não somente retirá-lo.
É importante entender quais os condicionamentos que aquele indivíduo teve (desde a infância) em relação a aquele alimento ou emoção, quais recompensas ele teve e como ele foi ensinado a lidar (“pare de chorar que te dou doce”, “se comer a alface te dou o doce”).
Texto por: Pietra Fogaça – Graduanda em nutrição