Gordura visceral e o risco de dores crônicas em mulheres
Postado em 24/10/2024 às 14h:35
O problema silencioso afeta órgãos vitais, como fígado, pâncreas e estômago e aumenta em até 60% o risco em mulheres
A gordura visceral, que não é visível, é aquela que vai se acumulando na parte mais profunda do abdômen e afeta os órgãos localizados na região, como fígado, pâncreas, intestino e estômago. Esse tipo de gordura é muito nociva porque libera substâncias inflamatórias e hormônios que causam inflamação crônica no corpo. A obesidade, principalmente a abdominal, não pode ser mais vista apenas como uma questão de estética. A gordura aumentada na região abdominal está associada a maiores riscos de hipertensão arterial, diabetes, dislipidemia, infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral (AVC).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a circunferência abdominal deve ser de até 80 cm para as mulheres e 94cm para os homens, números acima destes são considerados excesso de gordura abdominal. Em pessoas saudáveis o percentual de gordura corporal total ideal é de 10%.
“A obesidade é vista hoje pela ciência/medicina como uma doença, tanto que tem até CID (Classificação Internacional de Doenças), e é assim compreendida porque pessoas com obesidade além de terem maiores riscos de doenças cardiovasculares e metabólicas que já foram citadas acima, também possuem maiores riscos de mortalidade. É importante salientar que mesmo que a pessoa com obesidade abdominal não tenha alterações nos exames de sangue, ou seja, alterações de LDL-colesterol, HDL-colesterol, triglicerídeos e glicemia, ainda assim, possuem maiores riscos de doenças e mortalidade”, alerta Raphael Carvalho, professor do curso de pós-graduação em Emagrecimento & Metabolismo na Faculdade UNIGUAÇU.
O estudo científico publicado na Endocrine Reviews, mostra que pessoas com obesidade, mesmo sem alterações nos exames de sangue, possuem maiores riscos de doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2 em comparação com pessoas eutróficas (que são aquelas que possuem uma boa alimentação e peso adequado). Já a pesquisa publicada no Journal of the American College of Cardiology (Revista do Colégio Americano de Cardiologia) que acompanhou 3,5 milhões de pessoas durante um período de 5,4 anos, revelou que pessoas com obesidade, mesmo sem anormalidades metabólicas nos exames de sangue, apresentam um risco maior de doença cardiovascular, cerebrovascular e insuficiência cardíaca quando comparados aos indivíduos com peso adequado.
Portanto, a análise precisa ser muito mais ampla, aprofundada e realizada com todo o respeito com as pessoas que possuem obesidade abdominal. A boa notícia é que o exercício físico é uma das principais ferramentas para se promover a redução da gordura abdominal e com isso o emagrecimento.
Uma pesquisa recente publicada na revista científica Regional Anesthesia & Pain Medicine, descobriu que níveis mais elevados de gordura visceral ou subcutânea aumentam em até 60% o risco de dores crônicas em mulheres. Dados do estudo realizado pela Universidade da Austrália Ocidental mostram que quanto mais gordura as pessoas carregam no abdômen, maior a chance de relatar dor, ou seja, estar acima do peso, com maior índice de massa corporal (IMC), também foi associado a maior probabilidade de dor. A melhor maneira de acabar com as dores é a redução de peso através da prática de atividade física.
“E antes de você se perguntar, saiba que não é fazer exercício abdominal que irá te levar à redução da gordura do abdômen. Para ter o efetivo emagrecimento será necessário realizar preferencialmente o exercício resistido (como a musculação, funcional, Crossfit) combinado com o exercício aeróbio (na rua, esteira, bicicleta, natação), pois essa combinação é o que os estudos vêm demonstrando como o mais eficiente para o emagrecimento. E ao contrário do que muitos pensam, não é necessário você gostar de exercícios, mas sim, de fazer”, orienta Carvalho.
O questionamento de muitas pessoas é: como fazer algo que não gosto ou até mesmo que odeio? Para Raphael a resposta é simples – a pessoa fará e terá aderência ao entender claramente que isso que ela não gosta (exercícios físicos), vai ajudar a viver mais e melhor, permitindo ter menores riscos de doenças cardiovasculares, metabólicas e de mortalidade. Além disso, proporcionará uma melhor capacidade de realizar suas tarefas do dia a dia, aumento do ânimo, da disposição, da atenção, da sensação de bem-estar e melhora da função cerebral.
Para vivenciar todos esses benefícios fisiológicos que permitirão que a vida tenha um sabor mais especial e seja vivida com mais intensidade é necessário fazer algo que não gosta ou até mesmo odeia, que é o exercício físico, mas com certeza para ter todos esses benefícios vale a pena o sacrifício, já que é em prol da vida e da forma que irá vivê-la. É importante destacar que não é necessário treinar muito para obter as modificações fisiológicas no organismo que irão levar ao emagrecimento. Os estudos são bem claros e mostram que treinar cerca de três vezes por semana por cerca de 30 minutos por sessão já promove adaptações fisiológicas significativas associadas a perda de peso.
Aliada ao exercício físico, uma alimentação com mais qualidade adiciona ainda mais resultados ao emagrecimento, já que ambos (exercício e alimentação) têm 100% de importância neste processo. “E se alimentar melhor não é abandonar totalmente os doces, bebidas alcoólicas ou qualquer outro tipo de alimento, mas sim, ter uma alimentação consciente, ou seja, entender claramente o porquê, quando e como cada alimento deve ser ingerido, sendo assim, haverá momento para o doce, para a cervejinha, para o vinho ou para qualquer outro tipo de alimento que você gosta, mas de maneira consciente e nada radical, e isso é facilmente conquistado com a ajuda de um nutricionista competente”, observa Raphael Carvalho.
A gordura da região abdominal é a que oferece maiores riscos de doenças cardiometabólicas (infarto, AVC, hipertensão arterial, diabetes, dislipidemia) e de mortalidade. O aumento da gordura visceral impacta também em um distúrbio neuroendócrino-metabólico que leva à redução da saciedade e aumento da fome, prejuízo imunológico com aumento de macrófagos do tipo M1 que secretam citocinas inflamatórias, leva à disfunção do miocárdio (coração), câncer, apneia do sono, síndrome metabólica e doença hepática (fígado).
“Nós, profissionais da saúde, temos que por meio de nossa profissão intervir de forma criteriosa e científica para promover o aumento da metabolização de gorduras, principalmente dessa região abdominal. Uma das possibilidades que temos é através das adaptações que o treinamento aeróbio intervalado de alta intensidade (HIIT) promove”, observa Carvalho.
Karstoft et al. (2013) randomizou pessoas com sobrepeso/obesidade e diabetes tipo II para o treinamento HIIT, treinamento contínuo de moderada intensidade ou grupo controle (sem treinamento). Não houve intervenção nutricional. Os resultados mostraram que as adaptações fisiológicas geradas impactaram na redução significativa da gordura visceral somente no grupo do HIIT.
O estudo de Cassidy et al. (2016) também mostrou que o treinamento HIIT levou a redução significativa da gordura visceral em obesos, além do aumento da função cardíaca (hipertrofia fisiológica cardíaca, melhora do volume diastólico final, volume sistólico e fração de ejeção) e diminuição da Alanine Transaminase e da Aspartato Aminotransferase o que denota melhora da função hepática.
Madsen et al. (2015) verificou que o treinamento HIIT em pessoas com obesidade impactou em alterações fisiológicas que reduziram de maneira significativa a gordura visceral, a resistência à insulina e a pressão arterial sistólica e diastólica, levando assim à diminuição da sobrecarga cardíaca e cerebrovascular.
“Se quisermos promover o emagrecimento perene, temos que nos aprofundar sobre o tema, ampliando e compreendendo os aspectos envolvidos na obesidade de maneira totalmente diferente do que vem sendo ordinariamente abordado. A obesidade e o processo natural de envelhecimento (senescência) estão relacionadas com o aumento dos níveis dos marcadores inflamatórios, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-a), proteína C-reativa e interleucina 6”, pontua o especialista em Fisiologia do Exercício.
Além disso, a obesidade e o envelhecimento também podem promover prejuízos na captação de glicose pelo musculoesquelético devido à redução na expressão de GLUT-4 (proteína transportadora de glicose), redução da massa muscular, diminuição dos receptores de insulina e levar a mudanças negativas no perfil lipídico (aumento da lipoproteína LDL e redução do HDL).
Sendo assim, obesos e idosos têm um risco aumentado de doenças cardiometabólicas, por isso, é imprescindível que esse quadro clínico e funcional seja modificado através da redução dos marcadores inflamatórios, melhora do perfil lipídico e redução da gordura corporal. Para promover essas adaptações fisiológicas uma das ferramentas que podemos utilizar é a musculação prescrita de maneira criteriosa.
Tomeleri et al (2016) randomizaram (dividiram aleatoriamente) 38 obesos idosos para o grupo do treinamento de musculação ou grupo controle (sem treinamento). O treinamento de musculação foi realizado em 3x/semana com apenas 8 exercícios. Não houve intervenção nutricional, pois o objetivo era analisar o impacto fisiológico da musculação. Os resultados mostraram associação entre o aumento da força muscular com a redução dos marcadores inflamatórios TNF-a, proteína C-reativa e interleucina-6.
A musculação levou à redução da gordura corporal e ao aumento da massa magra (avaliado pelo DEXA), além de promover aumento da força muscular (avaliado pelo teste de 1RM), redução significativa na glicemia de jejum e melhora do perfil lipídico (aumento do HDL e redução do LDL). Por isso, não há possibilidade da pessoa, principalmente idosa, não fazer o treinamento resistido (como a musculação).
“Portanto, quer fazer bike, caminhada, natação, dança ou qualquer outra coisa com seu aluno? Faça! Mas, o principal é o treinamento resistido (musculação), pois a vida dessa pessoa será totalmente diferente. O processo de emagrecimento não é fácil, o passo mais importante é não desistir toda vez que “cair” ou não obter o resultado esperado, recomece novamente quantas vezes forem necessárias, afinal, estamos falando da sua vida, que é o bem mais precioso. Lembre-se que tem gente que te ama muito e essas pessoas também irão querer te ver com mais saúde e qualidade de vida, então, não desista de você e da sua vida”, conclui o profissional de Educação Física.
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