Carboidrato de noite engorda mais?
Postado em 27/06/2024 às 10h:15
Eu tenho certeza absoluta de que, em algum momento de sua vida, você ou alguém que você conhece já sentiu medo ou receio de consumir alimentos ricos em carboidratos no período da noite, pois achava que “engordava mais”, certo? Antes de iniciar esse artigo, é necessário deixar claro que “engordar” é um processo CRÔNICO, assim como o emagrecimento – dessa forma, não há nenhum alimento e tampouco algum macronutriente em específico – como o carboidrato – que, por si só, seja capaz de “engordar” alguém. Se tivesse, já teríamos a solução para a desnutrição, mas não é tão simples assim o funcionamento do corpo humano.
Dito isso, também é importante entendermos que essa afirmação não é COMPLETAMENTE equivocada. Como dito anteriormente, o corpo humano é muito complexo, e o metabolismo dos nutrientes é dinâmico e ocorre de formas diferentes ao longo do dia (ainda assim, sem a capacidade “automática” de engordar, conforme propagado por alguns gurus da nutrição). Muitos se questionam quanto a isso, e é importante deixar claro que, por mais que as calorias sejam sim as mesmas após às 18 horas, o nosso metabolismo NÃO é!
Isso ocorre porque o nosso organismo se comporta de forma diferente ao longo do dia, nossa eficiência metabólica é diferente e, dessa forma, a nossa digestão e absorção de nutrientes está mais lentificada, o que facilita o desalinhamento circadiano caso haja um consumo excessivo de alimentos nesse período. Logo, consumir calorias excessivas durante a noite pode sim trazer prejuízos metabólicos e influenciar no ganho de peso, mas depende de todo o contexto do indivíduo, indo desde o seu nível de treinamento e rotina esportiva até seu histórico familiar de doenças e sua sensibilidade à insulina.
A melatonina é um hormônio que, além de outros aspectos importantíssimos, também desempenha função de regulação da liberação de insulina pelo pâncreas. Durante à noite, nós temos uma maior produção de melatonina e, junto com outros hormônios, ela desempenha sinalizações diferentes para o organismo. Lá nas células beta-pancreáticas do pâncreas, a melatonina irá exercer um efeito inibitório vinculado à proteína Gi, que promoverá uma cascata de sinalização intracelular, bloqueando o efluxo de cálcio e fazendo com que a insulina não seja liberada de forma efetiva. Ou seja, é fisiologicamente normal essa redução da capacidade de secretar/liberar insulina durante à noite.
Além de tudo isso, a insulina, por si só, exerce impacto glicêmico e também no metabolismo. Já que, se há menos insulina durante à noite, há também menor captação de glicose do sangue para a célula, provocando um quadro de hiperglicemia (aumento nos níveis sanguíneos de açúcar/glicose). Dessa forma, o impacto glicêmico de uma determinada refeição durante o dia não é o mesmo impacto de realizar essa mesma refeição durante o período da noite.
Um estudo forneceu a mesma quantidade de glicose (75g) de manhã e à noite para pacientes pré- diabéticos, e analisou a curva glicêmica. Os pesquisadores viram que, quando esses pacientes receberam a glicose pela manhã, a glicemia subiu – como esperado – e logo depois normalizou, afinal há uma secreção de insulina suficiente nesse período. O problema foi quando a glicose foi fornecida à noite, pois a glicemia subiu, mas teve dificuldade para descer, demonstrando que nossa captação de glicose à noite é sim menos eficiente.
Além disso, durante à noite, a sinalização que o alimento – no intestino – faz no pâncreas para que ele produza insulina é mais LENTA. Isso implica em, ainda mais, uma piora na eficiência e na resposta metabólica. Fora isso, é visto também que o gasto energético para digestão e absorção (termogênese induzida pela dieta), acaba ficando reduzido no período da noite quando em comparação ao dia. Ademais, a nossa capacidade de queimar gordura, no período noturno, também parece ser menor, além de provavelmente ocorrer maior expressão da vida da lipogênese de novo, nesse período.
Outro ponto importante é em relação aos cenários de superávit e de déficit calórico. No cenário de superávit, caso haja maior concentração calórica no período da noite, a tendência é sim que haja maior depósito de gordura e alterações metabólicas. Ademais, no cenário de déficit, caso haja maior concentração calórica no período da noite, pode ser que haja redução na eficiência da perda de peso (ainda que vá sim perder peso, pois está em déficit calórico).
É válido destacar, então, que quando o meio interno não está em harmonia com o externo, podemos ter problemas de saúde ou simplesmente uma resistência um pouco maior ao emagrecimento/perda de peso. Geralmente, o nosso meio interno está muito bem alinhado com o meio externo, o que é importante para a nossa saúde. Quando acostumamos o corpo a trabalhar em um cenário de completo “desalinhamento circadiano”, é importante compreendermos que diversos problemas metabólicos podem ocorrer, como resistência à insulina, obesidade, esteatose, dislipidemia, câncer, doenças cardiovasculares etc.
Nós somos seres diurnos, então precisamos alinhar o nosso meio externo com o nosso meio interno, de forma a ir de acordo com a nossa biologia e, portanto, reduzindo risco para diversas doenças. É visto que, uma pessoa com desalinhamento circadiano, tende a ter piores respostas no metabolismo glicídico, o que aumenta risco para diabetes.
Texto por: Pietra Fogaça – Graduanda em nutrição
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