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Por Pietra Fogaça

Graduanda em nutrição pela UFRGS, antropometrista ISAK nível 1 e atleta de fisiculturismo.

Tudo sobre o uso da gordura como fonte de energia

Postado em 07/10/2023 às 08h:00

Primeiramente, é necessário entendermos que o tecido fundamental armazenador de gorduras é o tecido adiposo, já que ele é formado por células especializadas (tecido conjuntivo especializado).
Essas células especializadas são chamadas de “adipócitos”, e elas têm a capacidade de armazenar triglicerídeos (também chamados de triacilgliceróis), que são basicamente a união de três ácidos graxos com uma molécula de glicerol.

Nós temos esses adipócitos na região subcutânea, pois temos uma grande camada de tecido adiposo nesse local, e também temos adipócitos na região visceral abdominal (envolvendo as vísceras).
Esse último é o depósito de gordura que confere maior risco cardiometabólico (ou seja, risco para hipertensão, diabetes, dislipidemia, câncer, etc.). Esse tipo de tecido envolve órgãos como o fígado, o intestino e o estômago.

No entanto, em alguns casos, esse depósito de gordura visceral é tão grande que chega a envolver o coração. A enzima Lipase Hormônio Sensível (LHS) é uma enzima do tecido adiposo que, quando ativada, é responsável por fazer a remoção de triglicerídeo do adipócito, pois ela quebra as ligações do triglicerídeo e libera seu conteúdo na forma de 3 ácidos graxos livres e 1 glicerol para a corrente sanguínea.

A enzima Lipase Lipoproteica (LPL) faz o contrário, ela reconstitui triglicerídeos ao religar 3 ácidos graxos com glicerol. Ou seja, há um balanço, mediado por essas duas enzimas, que controla a quebra ou a síntese/formação de triglicerídeos. Esse balanço depende do sistema energético, mas também do sistema endócrino, pois essas enzimas são sensíveis a determinados sistemas hormonais (insulina, glucagon, catecolaminas, GH, cortisol).

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Um bom exemplo seria o seguinte: eu acordo em jejum e, portanto, a minha glicemia e meus níveis de insulina no sangue estão mais baixos, mas, em contrapartida, o nível do hormônio glucagon está alto. A insulina ativa a LPL e o glucagon ativa a LHS, ou seja, em jejum eu não tenho estímulo para a síntese de triglicérides (já que a insulina está baixa). Por outro lado, tenho estímulo para a quebra de triglicérides ao ativar a LHS, pois o glucagon está alto.

Nesse último cenário, eu ativo a LHS, quebro triglicerídeo, uso ácidos graxos livres como fonte de energia e passo a poupar carboidrato (“economizo” o uso de carboidratos como fonte de energia)! Todavia, quando consumo o meu café da manhã logo depois, eu aumento a minha glicemia e, consequentemente, a insulina. Além disso, os níveis de glucagon irão cair, fazendo com que eu passe a sintetizar triglicerídeos.

Ou seja, normalmente, os indivíduos vão intercalando o dia com momentos de alimentação e momentos de jejum. Se o indivíduo realiza um exercício físico, o exercício irá produzir uma queda nos níveis de insulina, além de um aumento nos níveis de glucagon e aumento de catecolaminas (tanto o glucagon quanto as catecolaminas estimulam a LHS).

Devemos entender, portanto, que quando falamos de um HORMÔNIO, na grande maioria das vezes estamos falando de uma ação ENDÓCRINA e, portanto, esse hormônio – que é secretado de uma região do corpo – será lançado na corrente sanguínea e agirá à distância… Ele agirá de maneira SISTÊMICA, ou seja, em todo o organismo.

Logo, o glucagon – que é lançado na corrente sanguínea – irá agir no corpo inteiro, e a concentração de glucagon será a mesma caso você retire sangue do pé ou da mão. Isso quer dizer que ele circula da mesma forma, para diferentes redes vasculares e, quando ele chega nesses leitos vasculares, entra em contato com o tecido adiposo do corpo, de forma a exercer sua ação. Dessa forma, estará ativando a LHS de todo o corpo, quebrando triglicerídeos de todo o corpo e todo o corpo estará “lançando” ácidos graxos livres na corrente sanguínea. Esses ácidos graxos livres, então, serão transportados até o local onde há necessidade de energia (como o músculo esquelético).

Entretanto, as pessoas têm regiões preferenciais de depósito de gordura, pois nós possuímos diferentes DENSIDADES DE RECEPTORES (hormonais) em diferentes tecidos, e isso tem influência GENÉTICA.
Exemplo: um indivíduo, por genética, pode ter uma elevada concentração de receptores de insulina em relação aos receptores de glucagon no quadril.
Em contrapartida, no abdômen, esse mesmo indivíduo possui maior concentração de receptores de glucagon do que de insulina. Sendo assim, esse indivíduo possui maior tendência a ter maior gordura localizada no quadril.

No entanto, devemos lembrar que os receptores hormonais são bem específicos, e há receptores para diversos hormônios diferentes.

Quanto à estrutura da gordura, é importante entendermos que o ácido graxo é, na verdade, um ácido carboxílico (COOH) de cadeia alifática. Essas moléculas são pouco solúveis em água (quanto maior a cadeia carbônica, menor a solubilidade) e, por isso, são transportadas na corrente sanguínea com a ajuda da albumina, uma proteína. Esses ácidos graxos podem ser monoinsaturados, poli- insaturados ou então saturados, sendo que o ácido graxo mais abundante e utilizado é o Ácido Palmítico, que possui 16 carbonos.

Depois que esses ácidos graxos sofrem a lipólise (quebra), foram mobilizados, se transportaram para a circulação e entraram em tecidos específicos, eles podem sofrer o processo de beta-oxidação. A beta-oxidação nada mais é do que a queima (oxidação) dos ácidos graxos que vieram do triglicerídeo. Ela consiste basicamente na quebra da molécula de ácido graxo na sua ligação beta entre seus carbonos, de 2 em 2 carbonos. O processo de beta-oxidação ficará acontecendo até sobrar apenas 2 carbonos pois, obviamente, como só tem 2 carbonos, não será mais possível realizar mais uma beta-oxidação (já que não há mais ligação beta presente).

Ou seja, a molécula de ácido graxo foi sendo quebrada de 2 em 2 carbonos e, em cada “rodada”, além de formar Acetil-Coenzima A, formou também um FADH2 e um NADH2, que irão para a cadeia de transferência de elétrons para serem oxidados, gerando ATP (nossa principal moeda energética).

O Acetil-Coenzima A, resultante do processo de beta-oxidação, acabará indo para o famoso ciclo de Krebs, onde irá se condensar com o Oxalacetato e formar Citrato e, no final, formará ao todo 3 NADs, 1 FAD e 1 ATP, totalizando 12 ATPs.

Logo, cada ciclo de Krebs, partindo da Acetil Coenzima-A, irá gerar 12 ATPs. Calculando tudo, teremos uma geração total de 129 ATPs por molécula de Ácido Palmítico (palmitato) oxidado, o que é já é bastante coisa.
Todavia, se fosse uma molécula de Ácido Esteárico, que possui 18 carbonos, teríamos uma volta a mais e, portanto, teríamos a geração de 146 ATPs por molécula, o que é ainda mais significativo do ponto de vista energético.

Logicamente, como 129 ATPs é maior que 38 ATPs (que é a quantidade de ATPs que conseguimos obter através do processo de glicólise), se eu estou utilizando a gordura (triglicérides) como fonte de energia, eu estou conseguindo sintetizar mais ATP. Logo, é compreensível que acabo conseguindo permanecer em exercício físico por um período mais prolongado, já que estou utilizando mais gordura como fonte de energia (que é uma molécula altamente energética, que rende muito).

Por fim, vale ressaltar que uma das adaptações metabólicas mais importantes do exercício físico é a utilização de gorduras: quanto mais treinada a pessoa é, maior é a sua capacidade de priorizar a utilização de gorduras durante o exercício físico. Ou seja, treinar significa adaptar o sistema para POUPAR CARBOIDRATO, e poupar glicogênio muscular (fonte rápida de energia) é sim extremamente importante para o organismo em exercício físico.

Texto por: Pietra Fogaça – Graduanda em nutrição

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